Celia Queiroz, Master Coach e Consultora Sr
02 de abril de 2020
Agora com quase 20 dias de imersão, provocada pela pandemia que alterou tudo e todos em qualquer lugar do mundo, parece um bom momento para escrever sobre essa certa introspecção e inquietude que muita gente – eu também! – vem experimentando.
A exposição infinita de conteúdos online
Um bombardeio de fontes de conhecimento sendo compartilhadas – tudo para ficar presente na mente das pessoas – e links inumeráveis para acessar conteúdo, ler livros, assistir a filmes, lives, webinars, etc etc etc… Belo salto de desprendimento ao compartilhar e dar acesso ao que cada um tinha conseguido até então e agora com a oportunidade de um alcance que nem se imagina. E todos – ou ao menos uns 60% aqui em São Paulo, segundo uma estatística recente que vi – em casa! E aí vem um aspecto interessante: nossa casa é sinônimo de nosso lar, ou seja, local para o repouso, o estar em convivência com a família, desfrutar, ajeitar e mudar coisas a nosso bel prazer, a estabilidade, local símbolo de segurança, onde nos recolhemos quando queremos tranquilidade e ter a sensação mais real e concreta de pertencimento.
Trabalho é outra coisa. Há um conceito que nos impuseram de que “lá”, o local de trabalho, é onde vamos ou estamos para ganhar dinheiro para garantir nossa sobrevivência, das necessidades mais básicas às mais altruístas até, dependendo da atividade. É sempre impessoal, não podemos fazer e mudar coisas aleatoriamente, é onde temos que cumprir certos “rituais”, seguir normas não definidas por nós, entregar tarefas que ninguém está muito disposto a relevar quanto ao prazo ou qualidade, ou nos ajudar a concluir (cada um com seus problemas… já ouviu essa?). No trabalho, aquela edificação impessoal, local cujo “dono” é um CNPJ, obrigatoriamente paramos para um café com o colega que vem nos tirar do assento junto à mesa de trabalho, saímos desse mesmo assento para ir almoçar e para ir embora, afinal “lá” é o local de trabalho. Para chegar “lá”, usamos algum meio de transporte, vimos – será? – coisas no caminho – e muitas vezes temos algo para contar sobre esse trajeto, logo que “lá” chegamos ou em alguma das pausas acima mencionadas. O mesmo quando é hora de voltar para nosso lar. E o que aconteceu então?
A casa virou nosso escritório e agora?
A casa – o lar – virou, de repente, não mais que de repente, local de trabalho, cheio de adaptações de última hora para conseguir ter onde colocar toda a parafernália que temos “lá” no trabalho. Como separar as edificações e seus significados? Como se comportar combinando os certos rituais, as normas, a falta do trajeto na ida e na volta de “lá”? A falta do colega que chama para o café ou lembra que está na hora de ir almoçar. O conflito que agora, queira ou não, não tenho como ignorar e acabo direta e imediatamente “no olho do furacão”. O espaço que, por melhor que se tenha conseguido montar ou adaptar, segue sendo o lar e não “lá”.
Ter casa é ter um lugar que garante o direito de a pessoa ser pessoa, com o seu espaço, com as suas relações de comunhão, pessoa fonte de afetos e de intimidade. Nem sempre a casa é o lugar de concretização dos ideais de vida. Para isso, a gente normalmente precisa do “lá” que pode nos proporcionar parte, ao menos, desses ideais realizados. Através da casa aprendemos a ser acolhidos e a acolher, a dormir e a repousar e a assentar os nossos pés no mundo. A Visão Sistêmica de mundo nos ensina que cada parte é igualmente importante e a soma das partes não é igual ao todo, mas maior que ele. Assim, quando você não dá valor a um importante conhecimento prévio transmitido por outros, você não está considerando o que isso pode trazer para você e nem para a vida alheia.
E está ajudando a derrubar o sistema. Quando não colaboramos positivamente com o sistema a que pertencemos, ajudamos a criar uma “má sorte coletiva”, que fatalmente chegará a nós. Ou seja, o que nos chega é porque anteriormente não o olhamos com a atenção devida e isso vale para todos os setores da vida. Ser capaz de servir a esse sistema nos dá uma vantagem indiscutível de crescermos dentro da coletividade e de nos protegermos dentro dela igualmente. Esse momento tem nos colocado frente a muitos NÃOS de modo até bastante impositivo. Como na nossa natureza humana tudo que muda vem acompanhado de resistências e muitas dúvidas do tipo “o que eu ganho com isso”, conseguir ter abertura para receber TODOS os NÃOS impostos por essa mudança e as imposições de NÃOS que nenhum de nós pediu, parece ser uma arte.
Aceitar e contribuir
Na Visão Sistêmica, conseguir enfrentar isso aceitando que a minha parte é muito significativa no resultado do todo, e receber o não com abertura e sem resistências. Se conseguimos isso, receber os NÃOS que nos chegam e ajudando o sistema a se fortalecer, entendemos que o que temos agora são medidas preventivas, passando a trabalhar “lá” dentro do nosso lar, atendendo às diversas demandas com os recursos que a tecnologia nos fornece. Temos a grande oportunidade de ressignificar, assim, palavras/expressões como afeto, compartilhamento, parceria, produtividade, foco, gestão do tempo, trabalho de time, reunião, planejamento estratégico-tático-operacional, resultado, visão de futuro, gestão de negócios, e o que mais Você quiser acrescentar. E enquanto não temos as respostas de vacina ou medicamentos comprovados que curem ou nos imunizem quanto ao famoso COVID-19, acredito no gerenciar nossa vida, nossos pensamentos e atos, e dando nossa melhor parte ao sistema. Isso é exercer a inteligência que cada um tem. Veja em Você esse talento e seja generoso ao compartilhá-lo como sua melhor parte. A casa que habito é a casa que sou…no lar ou “lá”…e agora no “lá-lar”! Até breve!